sexta-feira, 13 de novembro de 2009

O jeito sutil chinês de dar o recado

A coisa pesaria no meu bolso, então resolvi ler direitinho matéria do China Daily, o jornal estatal chinês em inglês, sobre o aumento da tarifa de táxi em Beijing (http://tinyurl.com/ybfbe7p). A cada viagem, excetuando-se aquelas de tarifa básica (10 yuans, uns tipos R$ 2), será preciso pagar 1 yuan a mais - ou R$ 0,25, mais ou menos, sei que você já fez a conta. Bacana, nem vai doer tanto assim. Mas será a partir de quando que terei de dar o valezinho-gasolina-gás-ou combustível que o valha para o shifu, o mestre, como chamamos os taxistas por aqui?

Quem informou sobre o aumento não quis dizer a partir de quando a medida entra em vigor, segundo o jornal, cara de pau, como se todos não bebessem da mesma fonte, as tetas do governo chinês. O todos, no caso, são o entrevistado, o redator e o editor da matéria. Gente, chocadíssima com o jeito local de fazer jornalismo - ao qual não, não me acostumei. Nada que não pudesse ser suplantado pelas novas informações da tarde.

Circulou ontem pelo twitter (ao qual temos acesso usando outras plataformas) que o Barack Obama, o modelo do boneco de cera que abre este post, poderá atualizar aqui da China tanto as contas do twitter quando do Facebook, ambos bloqueados no país. É que para o presidente norte-americano, que visitará Shanghai e Beijing na semana que vem, há tratamento especial. Aliás, quem quiser conferir o Obama de cera aí de cima, deve ir a Shanghai também, aqui seguem os detalhes do museu: http://www.madametussauds.com/.

Deve ser para que o presidente não se sinta preso no Great Firewall of China, um trocadilho com a Grande Muralha (Great Wall, em inglês). Até porque o próprio porta-voz do Ministério das Relações Exteriores chinês, Qin Gang, lembrou ontem o quanto Obama, um negro, deve saber dar valor à liberdade. 

- Ele é um presidente negro e entende o movimento de abolição da escravatura e a importância de Lincoln para o movimento - disse Qin, ao citar o ex-presidente Abraham Lincoln (1809-1865), responsável por muito debate em relação ao fim da escravidão nos Estados Unidos (e, depois, pelo fim da escravatura). Você pode ler aqui - http://tinyurl.com/ydkd5lb - caso duvide do que estou escrevendo.

A referência à cor de Obama, como se o fato de ser negro lhe imputasse mais compaixão pela causa escravagista - ou como se carregasse nos genes lembranças dos maus tratos sofridos pelos antepassados -, surgiu para lembrar que o presidente tem de entender o quanto foi importante para o Tibete a China ter libertado a região do regime escravagista perpetrado pela teocracia de Dalai Lama - figura com quem Obama já anunciou um encontro em um futuro próximo. E, bueno, a China sempre se opõe a qualquer encontro de qualquer líder mundial com o tibetano. 

O Obama negro terá carta branca para twittar, mas não poderá dar um pio sobre o papel humanitário desempenhado pelo Dalai. Liberdade, mas sem abusar. Coisas da China paradoxal.

Noutro movimento midiático interessante que mostra o quão sutil, ingênua ou esquizofrênica é a mídia chinesa, a agência estatal, a Xinhua, lançou uma parceria com a Unicef para comemorar o Dia Internacional da Infância, neste 20 de novembro. Num esforço para pautar os veículos mundiais, promete cobertura multimídia 24 horas e até criou selo para marcar a iniciativa. Então lá estou eu lendo o especial - http://www.chinaview.cn/ucd2009/ -, quando me deparo com uma notícia exaltando a qualidade da educação da Coreia do Norte.

Tudo bem que sejam vizinhos e compartilhem interesses políticos - a Coreia do Norte só é a Coreia do Norte porque a China tem muito a ver com aquilo -, mas exaltar ao mundo algum tipo de feito do governo norte-coreano é exigir demais da paciência alheia. E então me pergunto se é birra ou ingenuidade. 

O texto (http://tinyurl.com/ygorqwm) vai contando que a educação prima a formação de geniozinhos, muitos dos quais descobertos já nos jardins de infância, onde os professores são treinados para terem olhar apurado para aqueles pitocos que desenvolvem habilidades extraordinárias. Já viu o sufuco que os pobres vão passar, né: terão treinamento mais rígido, aprenderão a adorar ainda mais o sistema governamental e a gente acredita em Papai Noel. Em tempo, as crianças norte-coreanas, não. Por lá, o feriado cai no aniversário de Kim Il-Sung, o fundador da república que na China tem nome oficial de Democrática e Popular, quando as crianças recebem presentes. Meigo, não?

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