sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Só comigo

2h, alguma coisa abaixo de 0C. Volto pra casa louca pela minha cama, após me fartar com paellas, tortillas espanholas e depois ainda dar uma de olho grande pra cima de quesadilla de pollo mexicana. Cama, cama, cama... Só isso o que eu gostaria de enxergar pela minha frente.

Ops, gostaria de enxergar alguma coisa pela frente. Prédio sem luz, corredor sem luz, caminho até os elevadores - até com um pouquinho de medo, pois é preciso andar prédio adentro na total penumbra - e tateio os botões. Nada, necas, nem em sonho. Óbvio, estamos sem energia.

Saio pra tentar alguma informação, só vejo uns chineses com lanternas, se dirigindo ao subsolo do prédio. Técnicos eletricistas, me parece óbvio. Ensaio uma conversa, mas não entendo nada. A não ser que não tem luz, mas isso se entenderia em qualquer língua.

Exasperada, nunca imaginei que um dia usuria esta palavra, ligo pra meu amigo que jantava comigo pra que ele me ajudasse na tradução. Tempo de espera para que se reestabeleça a energia: entre uma hora e algum período indeterminado. O chinês me olha curioso: "você mora em qual andar?". Respondo: "Décimo nono". Ele faz cara de quem tem pena de mim.

O meu amigo, acho, também sentiu pena. Convidou pra dormir na casa dele. Assim resolvi meu problema. A luz, pra quem quiser saber, voltou as 10h da manhã seguinte. Eu cheguei em casa às 11h.

No ano retrasado, nunca imaginei que usaria isso tão cedo pra me referir a 2007, já havia ficado fora de casa durante o inverno. Mas, veja bem, até calefação eu tinha, ainda que apenas a do corredor. Tem horas em que reclamamos de barriga cheia.

***

Ah, o décimo nono andar

Há dois meses moro num apartamento supimpa em Beijing. Foi o primeiro que escolhi com a marida Paula, pois os outros dois anteriores foram escolhidos por indicação, acomodação. Este foi todo pensado: perto do trabalho, numa região bonita, decoração decente, recém reformado. Fica no décimo nono andar e tem uma vista para algum canto da cidade que não consigo identificar. Não vejo nenhuma construção conhecida, nada de Cidada Proibida, Praça da Paz Celestial ou prédio da CCTV.

Vivo numa região conhecida como Niu Jie, ou rua da vaca - hmmmmmmmmmmm. Ali se concentra a maior comunidade de chineses muçulmanos de Beijing, o povo huimin. Não se come porco, a maior parte dos restaurantes servem os pratos que se comem em Xinjiang, região autônoma ao leste do país, na fronteira com um monte de países que terminão em quistão, como o Quirguistão e o Cazaquistão. Sinônimo de culinária maravilhosa. Muito tomate, pimentão, massas e batatas no cardápio.

Tudo perfeito. E, cerejinha do bolo, viver no décimo nono andar. A possibilidade de ver a cidade de dia ou de noite me é tão cara que foi este o principal critério de desempate na hora de eu escolher meu quarto - Paula havia me dado o privilégio porque no apartamento antigo, ela havia escolhido. Meu quarto tem janelões pra rua. O décino nono andar me encanta. Só nunca tinha pensado que talvez um dia teria de deixar de dormir em casa por justamente morar tão alto.

Será que tenho de levar lanternas quando for passear à noite? Subir 19 andares no escuro não é exatamente a experiência que quero ter na China.

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