segunda-feira, 13 de abril de 2009

Parece difícil, mas pode piorar

A simplificação dificulta a compreensão.

Com esta expectativa um tanto estapafúrdia e pouco animadora, o vice-diretor do Instituto de Linguística da Academia de Ciências Sociais da China, Wang Ning, anunciou na semana passada que o país passará por uma, digamos, reforma ortográfica. Será a primeira vez que haverá mudanças na forma de grafar alguns ideogramas chineses em pouco mais de 20 anos.

- Este é um problema que pretendemos resolver - acalma Wang, ao se referir à simplificação que complica, dando um certo alento àqueles que já, por ventura, estejam nervosos.

A China adotou caracteres simplificados em 1956, a fim de facilitar o aprendizado. Em 1986, uma singela lista de outros 2.235 ideogramas simplificados foi lançada. Desde lá, nunca mais se mexeu nos hanzi (汉字), que é como são chamados tais símbolos em mandarim. Em outras regiões, como Taiwan, Hong Kong e Macau - e até no Japão, que herdou da China o sistema de escrita - os caracteres nunca foram alterados. Ou seja, nestes lugares ainda se usam os tradicionais, como se convencionou chamar.

O governo não dá dicas de quando publicará a lista de novos caracteres, apenas afirma que será em breve e que esta já está pronta. Hoje, no entanto, teve de desmentir uma notícia publicada na província de Guangzhou que dava conta de que as alterações atingiriam até mesmo nomes próprios. Segundo a reportagem, a partir da publicação da nova lista, passariam a ser permitidos apenas 8 mil caracteres para serem usados nos nomes das crianças. Mas, não, não, os pais que fiquem tranquilos, sustenta o governo. A escolha do nome do filho único, maior parte dos casos das famílias por aqui, não ficará restrita a tão pequena esfera.

Eu enquanto brasileira sofrendo o processo de reforma ortográfica da língua portuguesa me pergunto sobre a amplitude de modificações em um sistema que se baseia em ideogramas - ou seja, um símbolo não fonético que representa um objeto ou uma ideia (ideia sem acento, agora).

Desde o ano passado, já há uma grita em relação aos caracteres. Um membro do Comitê Permanente do Partido Comunista da China, Pan Qinglin, pediu a volta dos símbolos tradicionais. Para ele, a reforma de meio século atrás foi feita às pressas, sem respeitar aspectos estéticos e científicos da formação dos hanzi. Além disso, segundo ele, os sistemas de escrita pelo computador poderiam ajudar no retorno ao modelo anterior, iniciativa que, além disso, aproximaria a escrita da China continental à das demais regiões.

Parece que não colou, vide o anúncio de mais simplificação por aí. Aliás, quem defende a manutenção do atual sistema na parte continental diz que seria muito difícil formar novamente duas gerações de chineses que já foram alfabetizadas segundo o modelo simplificado.

Fato é que, grosso modo, simplificar significa diminuir traços dos caracteres. E os caracteres são formados justamente por estes traços, muitos dos quais remetem a significados de pictogramas antigos. Tem gente que jura que pessoa, ou 人, mostra alguém de pé. Além desta associação mais óbvia (ahan), os caracteres são formados de radicais, os quais dão pistas sobre o significado e até sobre o som. E, ainda, são uma mão na roda para buscar as palavras no dicionário - pena que haja divergências quanto a contagem dos radicais, que varia de pouco mais de uma centena a até mais de 200. Alguns dicionários consideram determinada parte um radical, outros consideram outras partes radical também e está feita a salada.

Agora, radical mesmo eu achei um dos argumentos para a volta do padrão tradicional. E ele fala sobre amor, o que poderia ser meigo.

Amor em chinês é Ai, assim como no Japão. É uma das únicas palavras que guarda o mesmo fonema. Mas enquanto por aqui se escreve 爱, no Japão e também em Taiwan, Hong Kong e Macau, o amor é mais complicado, sai como 愛. Para não iniciados, talvez fique difícil perceber, mas sob o segundo traço vertical de cima para baixo, a versão simplificada exclui o 心, o caracter de coração. Lendo pela internet, descobri que dizem que os problemas surgidos na sociedade chinesa ocorreram devido à retirada do componente humano do amor.

Ai, diria eu.

Donde concluo que, em linhas gerais, é melhor simplificar.

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